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sexta-feira, 6 de março de 2015

Vereador combinava supostos pagamentos por telefone

Gian do NAE, do PMDB, é vereador em Macapá (Foto: Divulgação/Asscom CMM)
Interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça mostram como poderiam ter acontecido supostas articulações de agentes públicos e empresários para liberação de pagamentos na administração pública, práticas consideradas ilegais por órgãos de fiscalização. O conteúdo obtido com exclusividade reforça uma ação ingressada pelo Ministério Público (MP) do Amapá contra um vereador da capital amapaense, um ex-secretário municipal de Finanças e o dono de uma empresa que prestou serviços à prefeitura de Macapá.
A possível influência política com auxílio de um parlamentar para liberação de pagamentos a empresas com dinheiro público aconteceu em 2010. O vereador Gian do NAE, do PMDB, teria obtido vantagem indevida para conseguir a quitação de débitos da prefeitura de Macapá com a empresa M. V. B. Serviços, de propriedade de Felipe Edson Pinto, ambos denunciados por corrupção. O parlamentar ainda teria suposto auxílio de advocacia administrativa praticada pelo então secretário de Finanças Jocildo Lemos. As acusações são do Ministério Público. A influência do vereador seria em troca de materiais de campanha, diz a denúncia.
Jocildo Lemos afirmou que 'houve processo legal para o pagamento'. Felipe Edson também negou os crimes classificando as acusações do MP de "especulações". Entramos em contato com o vereador Gian do NAE por telefone e na Câmara Municipal, mas o parlamentar indicou o advogado dele, José Augusto, para comentar o caso, no entanto, a defesa não atendeu aos telefonemas.

Áudios de interceptações telefônicas de diálogos entre o vereador macapaense e o empresário fazem parte das provas colhidas durante a operação Mãos Limpas, deflagrada em outubro de 2010, pela Polícia Federal (PF). Quase vinte agentes públicos amapaenses foram presos, entre eles, o ex-governador, a ex-primeira-dama e o governador à época.
De acordo com a denúncia do MP, foram efetuados o pagamento R$ 230.326 à empresa M. V. B. Serviços, em 2010, depois das negociações intermediadas pelo vereador Gian do NAE.
“Antes mesmo que a prefeitura efetuasse o pagamento em favor da empresa de Felipe, o vereador, na certeza de suas articulações, foi flagrado pedindo uma espécie de ‘adiantamento’ da vantagem indevida para mandar confeccionar material de campanha, posto que foi candidato a deputado estadual naquele ano”, diz trecho da denúncia.
Um diálogo por telefone entre Gian do NAE e Felipe Pinto colabora com a tese do Ministério Público, segundo consta na ação. Veja abaixo:

Gian do NAE: Felipe.
Felipe: Hum.
Gian do NAE: Eu preciso resolver aquele meu problema hoje bicho.
Felipe: Pois é cara, eu to dependendo disso que eu to...
Gian do NAE: Mas pelo menos um zero só pra eu mandar fazer santinho e cartaz logo, melhor.
Felipe: Tá bom.
Mais de cinco interceptações telefônicas subsidiaram a ação contra os denunciados. Em uma das ligações, o vereador de Macapá entra em contato com o proprieário da MVB para perguntar o nome completo da empresa. Durante o telefone, o parlamentar repassa a informação ao ex-secretário de Finanças Jocildo Lemos. O diálogo acontece as 11h, em 14 de julho de 2010.

Gian do NAE: Felipe! Felipe! Como é o nome da firma lá da Prefeitura?
Felipe: MVB!
Gian do NAE: Jocildo, é M.G.B... M.G.B! (Diálogo paralelo com Jocildo)
Felipe: Não! É MV.. “V!”... M”V”B Serviços!
Gian do NAE: Não peraí (diálogo paralelo com Jocildo). MVB o que Felipe?
Felipe: Serviços!
Gian do NAE M.V.B Serviços, Jocildo. (diálogo paralelo com Jocildo) Falou, Jocildo!
Gian do NAE: Eu tava falando com o Jocildo. Era o Jocildo que queria saber.
No mesmo dia, em 14 de julho, por volta de 13h, Gian do Nae liga novamente para Felipe Edson. Ele informa ao proprietário da MVB que o pagamento foi autorizado pela prefeitura de Macapá.

Gian do NAE: Eu fui lá com o Jocildo, tá autorizado, entendeu?
Felipe: Hum.
Gian do NAE: O problema é que tá bloqueada a conta da Prefeitura.
Felipe: Hum.
Gian do NAE: Tá autorizado, diz que pode ser hoje ou amanhã....
(...)
Toda suposta influência política do vereador para o pagamento da empresa acontece em apenas um dia. Por volta de 17h, ainda em 14 de julho, o vereador de Macapá telefona mais uma vez para Felipe Edson e diz que o dinheiro será efetuado no dia seguinte por causa da transferência de recursos de uma conta bancária para outra.

Gian do NAE: Ei Felipe!
Felipe: Ei Gian!
Gian do NAE:Deixa eu te falar... eu fui lá com ele... ele tá transferindo o dinheiro de uma conta para outra e vai te liberar o cheque de manhã cedo.
Gian do NAE:Entendeu?
O pagamento teria sido confirmado pela própria prefeitura de Macapá, no portal da transparência. Foram liberados R$ 230.326,59 à empresa MVB Serviços Ltda. O dinheiro foi pago através de três ordens bancárias, sendo duas no dia dos diálogos, em 14 de julho e outra dois dias depois, em 16 do mesmo mês.
Outro lado
Entramos em contato com todos os citados na denúncia. Mas apenas Jocildo Lemo quis gravar entrevista. Ele afirmou que "houve processo legal para o pagamento" com passagens pela Controladoria-Geral (Cogem) e Procuradoria-Geral do Município (Progem).
"Todos os pagamentos eram orientados pelo gestor municipal. Eu afirmo com toda certeza que os débitos eram quitados mediante a autorização da controladoria. As secretarias faziam todo o processo e a Semfi somente finalizava os pagamentos. A minha relação com o vereador Gian era restritamente institucional e tratávamos de vários assuntos. Sobre esse assunto, da MVB, não me recordo de ter lembrado de conversar sobre isso. Nunca falei de pagamentos com qualquer vereador. Quanto ao empresário, eu não o conheço", disse Lemos.
Em nota, mesmo com as provas incluídas na denúncia, Felipe Edson disse que a ação do MP é “mentirosa e absurda”. Ele afirma ter "relação de amizade com Gian do Nae, mas nunca utilizou essa relação pessoal para pedir favores de natureza empresarial". O empresário completa que "sequer conhece ou foi apresentado em algum momento ao ex-secretário Jocildo Lemos".

 Pagamento é confirmado em site da prefeitura de Macapá (Foto: Reprodução/Prefeitura de Macapá)

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